segunda-feira, 25 de maio de 2009

1958/Las Mulatas de Fuego


Da janela de meu apartamento, localizado na Broadway esquina com a Rua 76 em Manhattan, podia observar muitas coisas interessantes. A cidade com todo o seu charme me fascinava. Queria tomar contato com tudo. Meus olhos não paravam na busca pelo “algo novo”. Quando não estava caminhando no entorno do prédio onde morava, passava um bom tempo grudado nas grandes vidraças das janelas de minha sala, no décimo andar, observando as pessoas lá embaixo. Eram tipos diferentes, estranhos, que me chamavam a atenção. Mulheres passeando com seus animais de estimação, gente vestida com roupas diferentes, tipos estranhos para mim. No canteiro central da avenida, os bancos serviam de descanso para os mais idosos, casais de namorados ou mesmo para solitários encapotados, esses quase sempre, consumindo algum tipo de bebida, na tentativa de afastar o frio ou quem sabe a solidão, um comportamento comum, como constatei no decorrer de minha estada.

A noite a paisagem era diferente. Eram visto grupos de jovens conversando, bebendo, cantando, fazendo algazarras.

Da janela do quarto, o cenário era diferente. Ficava do outro lado do bloco do prédio e, vez por outra, flagrava cenas inusitadas. Briga de casais, adestramento de animais, estudos de músicos, bailarinas ensaiando coreografias e curiosamente para mim, muitos moradores idosos e pouquíssimas crianças.

Lembro-me de uma senhora de idade bastante avançada que, invariavelmente, abria a persiana de seu apartamento por volta das 9 horas da manhã, já vestida, sempre usando luvas e chapéu. Saia, e só voltava no final da tarde. Vim, a saber, mais tarde, que aquela senhora, que já devia beirar os setenta anos, saia para o trabalho. Era telefonista de um hotel nas proximidades.

Mas o bloco ao lado nos oferecia também imagens generosas.

Numa destas ocasiões, flagrei um grupo de moças, que ensaiava uma coreografia de ballet no apartamento bem em frente ao meu. Fiquei um bom tempo a observar aqueles movimentos perfeitamente sincronizados. Estava impressionado. Torcia para que os ensaios se repetissem, com as persianas abertas, para que pudesse assistir a aquele show.

Um dia, recebendo uns amigos para uma sopa, fomos brindados com um ensaio do grupo. Chamei-os até a janela e puderam durante alguns minutos observar. As moças, quando perceberam a platéia, fecharam as persianas e acabaram com nossa alegria. Tudo de maneira bem simpática e cordial.

Desse grupo de amigos fazia parte um argentino, chamado Tony Ruiz, que trabalhava como “mestre de cerimônias”nos shows latinos em New York. Imediatamente identificou as bailarinas pela coreografia, como sendo do corpo de baile do Radio City Music Hall, ou seja, eram algumas das famosas Rockettes.

Tony era bem o tipo do argentino “charlador”.Vestia-se impecavelmente, penteava-se usando toda a “gomalina” disponível e, com um inglês horrível, conseguia se comunicar e tinha muitos amigos. Era esperto. Não tinha residência fixa. Morava em hotel barato. Chegava de mansinho e, quando a gente, percebia estava morando na sua casa.

Fui a alguns shows que ele apresentou com grupos venezuelanos, porto-riquenhos e cubanos. Saia-se muito bem. Sempre ao final dos shows, juntava-se ao elenco, para comemorar o sucesso, em algum restaurante ou casa noturna. Claro que sem convite algum, aliás, várias vezes fui incluído no pacote, e eu sempre aceitei. Era muito bom. Num destes espetáculos, apresentou um show com elenco de porto-riquenhos, que tinha um “cover”do famoso comediante mexicano Cantinflas e um cantor chamado “El Jibarito”, o qual, me confidenciou ser anunciado como um ídolo mirim, quando, na verdade, já havia completado 25 anos, mas para a platéia, facilmente passava por um adolescente . Tinha a cara de menino, e lógico, não se misturava ao elenco que saia para a noite após os shows, para não levantar nenhuma suspeita. Podia cruzar com algum espectador.

Nessa época ouvia-se muita música hispânica na América. Os discos de Perez Prado, Xavier Cugat, Tito Puente, Sonora Matancera e outros, eram disputados nas lojas de Manhattan. O mercado era grande, e em vista disso, os shows com elenco latino para esse público, eram comuns. Era o “ganha pão” de Tony.

Já fazia uns quinze dias que não tinha notícia do argentino, quando me apareceu em casa, acompanhado de uma mulata estonteante, duas vezes o tamanho dele - “ Carioca, vamos ter um show sensacional com um pessoal de Cuba, que aliás já está hospedado aqui no hotel ao lado, e gostaria que você me ajudasse a fazer companhia as dançarinas, que querem conhecer o Times Square”, e me piscou o olho. Estranhei aquele convite, mas era impossível de ser recusado. Comecei a desenvolver uma conversa com Anita, a simpática cubana, que gostou quando lhe disse que meu pai havia homenageado o poeta cubano Jose Marti, colocando em minha certidão de nascimento, como “middle name”, o nome do poeta. Aquilo a deixou espantada e, quando me dei conta, já eram três as cubanas comigo, desfilando em plena Broadway . Claro que aquela cena não chamou a atenção de ninguém, a não ser a minha. Tony o argentino virou meu ídolo! E se aproveitou disso, passando uma temporada sem pagar hotel, hospedado em minha casa.

Meu apartamento, virou refúgio das cubanas, aonde tomávamos Rhum , comíamos batatas chips e tínhamos longas conversas sobre samba, bolero, mambo e cha cha cha. Tudo longe do carrancudo empresário, que as controlava. Mas só as três, o resto do grupo só vim a conhecer no dia em que se apresentaram.

Grandes estrelas faziam parte do grupo. A mais famosa, a cantora Célia Cruz.

Era um grupo grande e antigo, as célebres “Mulatas de Fuego”. Nas conversas muito agradáveis que tive com elas, fiquei sabendo de sua história. Começaram em 1947 no famoso cabaré Tropicana , tiveram varias formações, sempre com seis bailarinas, três cantoras e uma banda. Fizeram vários filmes, viajaram muito pela América e muitas delas se casaram durante as turnês. Deixaram saudades.

No vídeo as Mulatas de Fuego com a orquestra Sonora Matancera e a cantora Célia Cruz.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

1980/Frank Sinatra


Roberto Medina, herdeiro de Abrahan Medina, grande empresário do ramo de eletrodomésticos, dono da rede Rei da Voz no Estado do Rio de Janeiro e Harmônicas Scandali, sempre foi muito precoce. Aos dezoito anos era superintendente da Midas Propaganda e aos dezenove,  vice presidente da rede Rei da Voz. Ingressou na Art Plan Publicidade, house agency do grupo imobiliário Veplan em 1969.

Em 1978 implantou a empresa Art Plan Empreendimentos. Ali realizou o que muitos empresários haviam tentado sem sucesso durante anos. Trouxe Frank Sinatra ao Brasil para um show memorável no Maracanã.

Ainda hoje, consta do Guiness Book of the Records, como o maior público já registrado em um show solo. Foram 150 mil pessoas.

Para se avaliar a enorme vontade dos brasileiros em receber “A Voz” em nossa terra, até brincadeiras de gosto duvidoso eram cometidas por meios de comunicação. Um destes fatos, aconteceu no começo dos anos 60.

A TV  Record anunciou a vinda do cantor, mostrando na divulgação uma silhueta com chapéu característico, que insinuava que aquele era Sinatra.

O show, marcado para a noite de 31 de março, entrou no ar, propositalmente atrasado, nos primeiros minutos do dia primeiro de abril, e quem adentrou ao palco, foi o cantor Decio Cardoso, um “ cover “do Sinatra. A  Record, sem nenhum escrúpulo, simplesmente confessou ser um “primeiro de abril”.

Mas voltando ao ano de 1980, o meio artístico simplesmente entrou em polvorosa, com a confirmação da vinda de Mr. Sinatra ao Brasil. Havia uma movimentação intensa, as

prateleiras das lojas de discos se prepararam e estavam recheadas com suas gravações.

Revistas publicaram reportagens, contando curiosidades sobre o cantor, os músicos da noite incluíram  os seus sucessos em seus repertórios. A Sinatromania tomava conta do país.Os fãs exultavam.

Acompanhei a carreira de Sinatra desde os  tempos em que ele era crooner. Conheço bem o seu repertório e, talvez por causa disso, não pudesse ficar distante do grande acontecimento de 2 de fevereiro de 1980.

Alguns fatos interessantes aconteceram. Certo dia fui procurado pelo cantor Decio Cardoso, aquele mesmo que cantava como Sinatra, que precisava de algumas músicas para um show que faria no Gallery, um “night club” fechado, comandado por José Vitor Oliva. A música que mais interessava a Decio era The Continental.

Enquanto isso, um grande agito acontecia na Rádio Capital, na época dirigida por Helio Ribeiro, outro fã confesso de Sinatra, que sabia dos meus conhecimentos, pois era comum, nos juntarmos para executar alguns de seus “hits”. Em nossos tempos de Radio Bandeirantes, nos refugiávamos em um estúdio, que tinha um belo piano, e fazíamos o nosso show particular. Ele cantando e eu acompanhando ao piano.

Por esta ocasião, além da assessoria de imprensa para a Rádio Capital, também assessorava Helio em algumas questões. E foi atendendo a sua solicitação, que colaborei

para colocar no ar um programa totalmente dedicado a Sinatra. José Maria Scacchetti foi o apresentador do programa. Elaborei o roteiro musical, ajudei com o texto e forneci os discos.

Helio fez questão que o programa tivesse a mesma duração do show, que lotou o Estádio do Maracanã. Qualquer tipo de transmissão durante a apresentação fora proibida, assim, mantínhamos um contato direto com nosso correspondente no Rio, que fora do ar  passava as informações, e estas eram repassadas aos ouvintes entremeando as músicas. O programa simultaneamente ao show terminou como o título de um dos maiores sucessos de Sinatra: “In the small hours of the morning”.

Para assistir performances de Sinatra ,acesse www.youtube.com.br e faça a pesquisa em seu nome.Como são videos protegidos não podemos exibi-los no blog.


segunda-feira, 11 de maio de 2009

1966/Lima Duarte

 

O ano prometia ser dos mais animados em termos de trabalho. Estava na Record, na época líder de audiência, fazendo rádio e TV.

Na rádio, com um programa diário e um semanal, e na TV, dois programas semanais. Um com a apresentação de Henrique Lobo (Dois na Gangorra), aos sábados à tarde, como produtor executivo, e outro, nas noites de sexta feira, com Blota Jr, como membro de uma equipe de produção, que incluía meu irmão Haya Hohagen, Lemos Brito, José Guimarães, Manoel Carlos e Blota Neto, filho do apresentador.

O “Blota Jr Show”, marcou  época na televisão brasileira. Blota era um   entrevistador  elegante, simpático, culto, de perguntas inteligentes e de rápido raciocínio.

Formava com Sonia Ribeiro, sua mulher, o casal mais elegante da TV.

Tinham muitos admiradores, e eram muito queridos por seus companheiros de trabalho. 

Tive com Blota Jr uma convivência muito prazeirosa.

Mas em junho desse ano, numa medida de contenção de despesas, houve um corte de funcionários. Henrique Lobo e sua equipe foram dispensados e nós também.

Blota como sempre muito companheiro, prometeu nos ajudar no que fosse possível.

Estávamos em começo de carreira na TV. Haya recém casado.

Blota Jr, já nessa época, militava na política. Haveria eleições para Senado, Câmara Federal e Assembléia Legislativa. Ele era candidato.

A ARENA, partido do governo, pelo qual Blota disputaria a eleição, estava se estruturando para a campanha e seu presidente, o deputado federal Arnaldo Cerdeira, lhe pediu, por ser ele homem de comunicação, que indicasse alguém para organizar aquele setor. Imediatamente fomos indicados.

Tivemos uma longa reunião com o presidente Arnaldo Cerdeira e com o secretário geral do partido, Hamilton Prado, ocasião na qual, traçamos a estratégia da campanha para rádio e TV. 

Fizemos várias inovações, entre elas, um programa de entrevistas semanal, com o comando de Branca Ribeiro e Roberto Arruda na TV Excelsior, foi um verdadeiro sucesso, por fugir do esquema convencional dos programas políticos.

Branca Ribeiro sempre vestindo longo e Roberto de smoking, conduziam programa, focando o lado humano e pessoal do candidato. Não se falava em política.

Lá os candidatos falavam de poesia, contavam causos, mostravam suas aptidões artísticas, o que prendia o telespectador, num horário onde, o número de televisores desligados, era cada vez maior, pois, de um lado a ARENA, do outro o PMDB, se confrontavam com muita baixaria, e um verdadeiro festival de insultos.

Ao criar uma opção para apresentar os candidatos, conseguimos melhorar a audiência e, por que não dizer, torná-lo um sucesso.

Para o rádio, montamos na sede do partido,  um estúdio de gravação de áudio e um bureau de informações, comandado pelo diplomata, jornalista e historiador, José de Carvalho e Silva, meu querido avô, que se encarregava de levantar temas de interesse público para serem distribuidos aos candidatos. Gravávamos a fita, que era enviada às emissoras, para entrar nos horários reservados a campanha política.

Certa ocasião, Cerdeira nos chamou e pediu um material de impacto para por no ar no horário nobre. Queria um texto forte e alguém de fácil comunicação para interpretar. De preferência um ator.

Silas Roberg , redator, dramaturgo, foi o escolhido para redigir o texto. Procuramos Lima Duarte para gravar, mas ele se recusou. Não compactuava com o governo. Indicou-nos o excelente Percy Ayres, que também era um ator de interpretações de grande impacto. Chegamos a ensaiar o texto algumas vezes, mas as vésperas da gravação, que seria feita nos estúdios da TV Tupi, Percy foi acometido de uma crise renal e hospitalizado. Corremos para Lima Duarte, contando nosso o problema. Lima  olhou bem pra nós ,coçou a cabeça e disse : “Eu vou fazer! Preciso ajudar um cenógrafo da TV, que foi levado pelo pessoal do Dops e que tem mulher e filhos, que ficaram desamparados.Vou fazer por eles”

E fez.  E com que categoria!  Com que profissionalismo!

Ao final do trabalho  Cerdeira enalteceu bastante a peça elaborada por Lima Duarte, a quem creditou parte do sucesso, que foi a campanha.

O ator por seu lado ficou feliz por ajudar um amigo, naquele momento difícil, pelo qual passaram vários de seus colegas.

Recebemos muitos elogios e a gravação  foi muito comentada na época.

No vídeo uma homenagem a esse incrível ator.