quarta-feira, 21 de outubro de 2009

1967/Roberto Isnard


Durante o período em que trabalhei na Ultragaz, fiz alguns amigos, muitos em função de minha atividade. Lidava com pessoal de imprensa e publicidade. Ora estava dentro de um estúdio acompanhando a gravação de “spots e jingles”, ora em estúdio de tv, verificando se os cenários do “Ultranotícias” estavam em ordem. Não faltavam também os encontros com o pessoal de imprensa, já que não raro, aconteciam explosões de botijões de gás e, como nosso superintendente era também presidente da Associgás, eu era convocado para organizar coletivas onde ele dava as explicações sobre os acidentes, que eram provocados por produtos adquiridos em depósitos clandestinos.

Na época havia uma forte concorrência entre a Ultragáz e a Liquigáz. Era uma verdadeira guerra entre elas e as concorrentes nanicas, bem ao estilo da guerra dos refrigerantes existente entre Coca Cola/ Pepsi Cola e as “Tubainas”.

A briga pelo mercado do gás engarrafado era muito grande. A Ultragáz levava vantagem, pois além de distribuir o produto, tinha uma grande rede de lojas pelo interior, que vendia eletrodomésticos, sendo o fogão a gás o seu principal produto além dos botijões, claro.

Peri Igel era o presidente da Ultragáz e tinha um colaborador bastante conhecido da imprensa. Era o radioamador Roberto Isnard. Ele tinha funções de relações públicas e era muito querido pelos companheiros de trabalho. Já tinha ouvido falar em Roberto Isnard. Era deficiente visual e seu hobby era o radioamadorismo. Já o tinha visto em programas de tv falando sobre o assunto.

Certo dia, fui chamado a seu gabinete para combinarmos a realização de um almoço com a imprensa para homenagear a jornalista Helle Alves, dos Diarios Associados, a única brasileira presente quando da captura de Che Guevara na Bolivia, matéria que foi ao ar no Ultranotícias com muito destaque.

Nunca havia conversado com Roberto e nem sabia que ele trabalhava na Ultragáz. Ficamos bastante tempo falando sobre radioamadorismo, antes de entrar no assunto principal, que era a homenagem a jornalista.

Tinha em minha lembrança um dos filmes mais comoventes que assisti em toda a minha vida, que foi “Se todos os homens do mundo”. Filme francês da fase do “cinema realista” onde seu diretor Christian Jacque retratou, com muita competência, o drama vivido por tripulantes de um barco pesqueiro, acometidos por botulismo, doença provocada pela ingestão de carne deteriorada. Apenas um dos tripulantes estava são e conseguiu passar por rádio uma mensagem de socorro que foi captada por um radio amador, que fez contatos com outros, formando uma corrente internacional, que possibilitou que chegasse aos tripulantes um soro salvador. Um filme cujo tema era a solidariedade, e devia ser exibido nos dias de hoje.

Comentava com Roberto a beleza do filme, e senti nele uma vontade muito grande de falar a respeito do radioamadorismo e de sua atuação. Foi quando me relatou o trabalho que os radioamadores brasileiros desempenharam em 1960 durante o rompimento do açude de Orós no Ceará.

Depois vim a saber da dedicação e participação de Roberto Isnard na ajuda aos moradores da região aonde aconteceu a tragédia, o que lhe rendeu várias homenagens. Roberto também me emocionou.

Passei a frequentar a sala de Roberto e tivemos alí longos e agradáveis papos. Era extremamente bem relacionado e tinha sempre uma história pra contar.

Certa vez fui procurado por uma colega de trabalho, que me comunicou que Roberto seria homenageado no programa “Esta é a sua vida”, comandado pelo jornalista Carlos Gaspar na TV Tupí, e gostaria que eu participasse. Claro que me coloquei a disposicão. Recebí a visita de um dos produtores do programa, passei algumas informações sobre Roberto e no final da conversa entrou em minha sala o Haya meu irmão gêmeo, que tinha ido me buscar no trabalho. Na hora esse produtor teve a idéia de convidar meu irmão para participat também do programa, pois queria fazer uma brincadeira com o Roberto. Só pra lembrar, Haya e eu somos gêmeos idênticos.Temos o mesmo timbre de voz, até nossa mãe nos confundia ao telefone e por várias vezes quando fazíamos programas de rádio juntos, e um de nós saia do estúdio por algum motivo, o outro falava pelos dois. Fomos os dois aos estúdio da TV Tupí no dia do programa como combinado. Roberto estava conosco na platéia, pois havia sido informado que o homenageado era Henning Boilesen, superintendente da Ultragáz. Carlos Gaspar abre o programa, faz todo aquele blábláblá e em vez de Boilesen chama Roberto Isnard dando ênfase a apresentação “E Roberto Isnard ...essa é a sua vida!” Aplausos e Roberto acompanhado por um dos produtores sobe ao palco e alí começa o programa .

Muitos convidados que por algum motivo tinham alguma ligação com Roberto eram chamados para homenagea-lo. Foi quando Carlos Gaspar me chamou e, em vez de eu ir ao encontro de Roberto, foi meu irmão, empurrado por um dos produtores. Haya disse algumas palavras a Roberto que imediatamente retrucou...”Mas esse não é o Lafayette”, em seguida adentrei ao palco e a platéia aplaudiu admirada. Roberto, não sei como, sabia de meu hábito de usar gravatas coloridas, e respondeu com muito humor a Carlos Gaspar, como havia distinguido minha voz, uma vez que nem minha mãe conseguia: “Foi pela cor da gravata”. Roberto Isnard é uma dessas pessoas raras de se encontrar nos dias atuais.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

1966/Blota&Sonia

O período em que trabalhamos na Rádio e Tv Record, foi muito proveitoso em muitos sentidos. Profissionalmente foi o período do aprendizado. Vínhamos do teatro, aonde fazíamos praticamente tudo. Iluminação, direção de cena, produção musical etc.etc.

Na tv é diferente, cada um desses ítens tem um profissional da área. A nossa função era a de criar e outros executavam.

No Blota Jr. Show, nossa primeira experiência televisiva, o nosso trabalho era o de sugerir entrevistas para o comandante do programa, preparar a ficha dos entrevistado com seu perfil e as perguntas que seriam interessantes de se fazer. Esse trabalho era dividido pela equipe, ficando para o apresentador o contato direto com os entrevistados especiais, tais como políticos e figuras de maior relevância.

Lembro-me de uma entrevista que Blota Jr. fez com um indíviduo de nome Aladino Felix, também conhecido como Sábato Dinotos, que dizia ter traduzido as profecias de Nostradamus. Ele era meio estranho e tempos depois apareceu nos noticiários acusado de terrorismo. Durante a entrevista, Blota teve que cortá-lo chamando os comerciais, quando começou a profetizar que “o homem de barro seria expulso e daria lugar ao homem de natal” interpretando o livro de Nostradamus, querendo dizer que Adhemar de Barros, governador de São Paulo na época, seria cassado e em seu lugar, assumiria Laudo Natel.

Bem, a verdade, é que a cassação de Adhemar de Barros aconteceu e Laudo Natel, que era seu vice, assumiu o governo do Estado de São Paulo em 6 de junho de 1966. Sábato Dinoto esteve preso no Dops de onde desapareceu .

Não me lembro quem convidou Sábato Dinotos para o ”Blota Jr. Show“, só me lembro que o” Dr.”, como era carinhosamente chamado o “chefe”, distribuiu bronca pra todo mundo.

Aconteceram passagens muito curiosas durante a nossa permanência na Record. O ambiente era de muita camaradagem entre os companheiros. Tínhamos uma associação de funcionários, que colocava a nossa disposição colônia de férias, empréstimos financeiros, vendas de produtos a preços de fabrica, em fim, quem trabalhava na Record trabalhava feliz.

Além de trabalharmos na Tv, tínhamos um programa de rádio diário, que entrava no ar por volta das 23 horas. Numa atitude pouco comum na época, o salário em espécie e em dia, era recebido durante o horário do programa de rádio. A Record era líder de audiência e tinha uma situação financeira bem saudável .

Foi lá que nasceu, numa iniciativa dos funcionários, a prática do “showbol” no espaço aonde era gravado o Circo do Arrelia. Juntavam produtores, apresentadores, funcionários de todos os níveis para, até altas horas da noite, baterem aquela bola.

Uma das lembranças que guardo daquela época, foi um sorteio que a nossa associação fez de um fusca zero, para todos os funcionários da emissora, durante uma festa de aniversário da Record. Pra variar, chamaram o casal mais famoso e respeitado da TV na época, Blota Jr e sua esposa Sonia Ribeiro, para comandarem o sorteio. Eles eram os mestres de cerimônias de todos os festivais, shows do dia 7, e foram os precurssores das famosas duplas, que até hoje são utilizadas, nos principais programas de nossa TV.

O pessoal já estava impaciente quando Blota e Sonia começaram o sorteio, que tinha muitos brindes antes de chegar ao prêmio maior: o sonho de dez entre dez brasileitos - o fusca zerinho.Depois de muito suspense, Blota anuncia: ”E o fusca vai para o número ...tal!” Todo mundo procura o número tal, e surpresa, o número sorteado era o de Sonia Ribeiro! Tumulto geral, vaias, assobios, gritos de “marmelada”, até que Blota com o microfone em punho acalma o pessoal e anuncia: “Pessoal acho justo que, como a Sonia ganhou o prêmio, ela fique com ele, mas para mostrar a vocês o quanto admiro a todos os companheiros, prometo que sábado que vem, aqui mesmo, estarei sorteando um de meus carros!” Com esse anúncio, a euforia tomou conta de todos presentes, afinal, Blota só desfilava de Mercedes Benz ! A imaginação correu solta, era conversa por todo lado, durante a semana, nos corredores era o único assunto, todos queriam adivinhar qual dos Mercedes o” Dr.” ia sortear.

Conforme o prometido, no sábado seguinte, todos reunidos no páteo e Blota anuncia o sorteio. O carro a ser sorteado adentra o páteo envolto em uma nuvem de fumaça, provocada pelo óleo colocado propositadamente no carburador pelos seus ocupantes, que eram Blota Neto, filho de Blota e Bruninho um de seus assessores. O carro, um Dodge ano 1941 que Blota havia comprado de um funcionário da Secretaria de Turismo para ajudá-lo, por este se encontrar numa situação financeira dificil . A gargalhada foi geral!

A jornalista Lyba Fridman, assessora de comunicação da Record, foi a sorteada. E o que para muitos parecia um “mico”, serviu para tirar a jornalista de um tremendo sufoco. Lyba vendeu seu prêmio para um desmanche e com o dinheiro, conseguiu quitar uma dívida na justiça, cujo prazo se expirava no dia seguinte. Sempre foi grata a Blota Jr. pela atitude que, de uma brincadeira, salvou-a de uma situação difícil.

Lyba foi também, uma das responsáveis pela divulgação de vários trabalhos que realizamos, durante os anos de ouro da bossa nova. Era colunista de rádio, tv e shows e trabalhou nas principais revistas especializadas.

Blota Jr., apesar de não termos tido uma convivência maior, foi uma pessoa que sempre admirei, assim como Dna Sonia Ribeiro, que foi, sem dúvida, a primeira dama da televisão brasileira por sua postura,classe e elegância.