terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Feliz 2010!!

Desejo a todos que acompanham o "contosdolafa"um alegre natal e um feliz ano novo.
Voltaremos a partir de março de 2010.

domingo, 1 de novembro de 2009

1967/Justiça de Salomão


Foi na inauguração da TV Bandeirantes que o programa “Justiça de Salomão”entrou no ar sob o comando de Salomão Esper. Na produção do programa feras como Alvaro Moya, Rebello Jr., Clodoaldo José, Nicéias e Haya Hohagen. Direção de tv de Ivan Magalhães e os câmeras Pedro Umberto, Alan Kardec e o saudoso Botini.

Conhecemos Salomão durante a campanha eleitoral realizada em 1966, quando Haya e eu fomos responsáveis pelo setor de rádio e tv da ARENA partido do governo. Foi por causa de seu pequeno, mas eficiente “estúdio”, que ficava nos porões da Rádio América, na rua da Consolação esquina com av. Ipiranga, aonde hoje está o Edificio Zarvos. Lá eram gravados e copiados spots e material de candidatos, que eram enviados para outras cidades. Foi o amigo Berto Filho, locutor dos mais requisitados na época, quem nos indicou o “Publisol”, nome do estudio que tinha como sócios Salomão e o espanhol José Velazco. Acabada a campanha eleitoral, ficou a amizade.

Durante o período em que o programa ficou no ar, houve uma convivência grande de Haya com Salomão. Além das conversas diárias, todas as terças feiras, dia do programa, Haya almoçava na casa de Salomão. Era quando discutiam e acertavam detalhes do programa. Sempre após o almoço, Salomão pedia licença, e subia para seu quarto fazer a sua “siesta”. Haya o aguardava, enquanto finalizava o roteiro do programa. A essa altura, Haya dirigia sozinho o “Justiça”.

O programa estava entre os melhores de entrevistas da televisão. Salomão no comando, mostrava muita competência e preparo. Algumas entrevistas ficaram famosas, como a que fez com o superintendente do Hospital das Clinicas de São Paulo, por ocasião do primeiro enxerto de mão feito no Brasil; a entrevista com Moraes Sarmento, na época a maior audiência do rádio paulista, que comoveu os espectadores; a com Blota Jr, que comentou fatos pitorescos de sua carreira; além de muitos políticos, gente do povo como o jogador de sinuca “Carne Frita”, curiosidades como representantes de associações de inventores e de mágicos, enfim enquanto durou foi um sucesso.

Salomão sempre tratou seus entrevistados com a mesma importância, afinal, eram eles as estrelas de seu programa. As perguntas eram sempre as que, com certeza, o telespectador faria.

Na Bandeirantes sempre teve o respeito do “seu João”, que o convocava toda vez que uma autoridade visitava a emissora. Era o mestre de cerimônia de todas as ocasiões.

Hoje aos 80 anos, ao lado de Joelmir Betting e José Paulo de Andrade, participa do Jornal da Bandeirantes Gente das 8 às 10 da manhã, com intervenções brilhantes, que são verdadeiras aulas.

Chega todos os dias bem cedo na emissora com sua pilha de jornais debaixo do braço e sua sacolinha contendo bananas e biscoitos de povilho. Continua a ser o mesmo “Saloma” bem humorado, de bem com a vida e a disposição dos amigos.

Tivemos, Haya e eu o prazer de, junto com nossas esposas, sermos convidados a participar da homenagem que os filhos, Sergio, Márcia e Ana Ligia fizeram ao querido Salomão.

Um almoço cheio de emoção, onde muitos compareceram para o abraço de parabéns ao querido amigo, confirmando a simpatia e bom humor, tão característicos da personalidade de quem soube chegar a maturidade sem perder o brilho e o encanto da juventude.

Aliás, neste almoço, fez questão de dar uma canja, e fazendo dueto com Nelson Gonçalves, cantou o samba onde nos confirma sua filosofia de vida, rica de amigos, cheia de simplicidade e de sabedoria: ”mas depois que o tempo passar, sem que ninguém vai se lembrar que fui embora,por isso é que eu canto assim, se alguem quiser fazer por mim, que faça agora”.

Na foto acima,em primeiro plano Haya Hohagen e ao fundo Salomão Esper conversa com Blota Jr. momentos antes de "Justiça de Salomão entrar no ar.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

1967/Roberto Isnard


Durante o período em que trabalhei na Ultragaz, fiz alguns amigos, muitos em função de minha atividade. Lidava com pessoal de imprensa e publicidade. Ora estava dentro de um estúdio acompanhando a gravação de “spots e jingles”, ora em estúdio de tv, verificando se os cenários do “Ultranotícias” estavam em ordem. Não faltavam também os encontros com o pessoal de imprensa, já que não raro, aconteciam explosões de botijões de gás e, como nosso superintendente era também presidente da Associgás, eu era convocado para organizar coletivas onde ele dava as explicações sobre os acidentes, que eram provocados por produtos adquiridos em depósitos clandestinos.

Na época havia uma forte concorrência entre a Ultragáz e a Liquigáz. Era uma verdadeira guerra entre elas e as concorrentes nanicas, bem ao estilo da guerra dos refrigerantes existente entre Coca Cola/ Pepsi Cola e as “Tubainas”.

A briga pelo mercado do gás engarrafado era muito grande. A Ultragáz levava vantagem, pois além de distribuir o produto, tinha uma grande rede de lojas pelo interior, que vendia eletrodomésticos, sendo o fogão a gás o seu principal produto além dos botijões, claro.

Peri Igel era o presidente da Ultragáz e tinha um colaborador bastante conhecido da imprensa. Era o radioamador Roberto Isnard. Ele tinha funções de relações públicas e era muito querido pelos companheiros de trabalho. Já tinha ouvido falar em Roberto Isnard. Era deficiente visual e seu hobby era o radioamadorismo. Já o tinha visto em programas de tv falando sobre o assunto.

Certo dia, fui chamado a seu gabinete para combinarmos a realização de um almoço com a imprensa para homenagear a jornalista Helle Alves, dos Diarios Associados, a única brasileira presente quando da captura de Che Guevara na Bolivia, matéria que foi ao ar no Ultranotícias com muito destaque.

Nunca havia conversado com Roberto e nem sabia que ele trabalhava na Ultragáz. Ficamos bastante tempo falando sobre radioamadorismo, antes de entrar no assunto principal, que era a homenagem a jornalista.

Tinha em minha lembrança um dos filmes mais comoventes que assisti em toda a minha vida, que foi “Se todos os homens do mundo”. Filme francês da fase do “cinema realista” onde seu diretor Christian Jacque retratou, com muita competência, o drama vivido por tripulantes de um barco pesqueiro, acometidos por botulismo, doença provocada pela ingestão de carne deteriorada. Apenas um dos tripulantes estava são e conseguiu passar por rádio uma mensagem de socorro que foi captada por um radio amador, que fez contatos com outros, formando uma corrente internacional, que possibilitou que chegasse aos tripulantes um soro salvador. Um filme cujo tema era a solidariedade, e devia ser exibido nos dias de hoje.

Comentava com Roberto a beleza do filme, e senti nele uma vontade muito grande de falar a respeito do radioamadorismo e de sua atuação. Foi quando me relatou o trabalho que os radioamadores brasileiros desempenharam em 1960 durante o rompimento do açude de Orós no Ceará.

Depois vim a saber da dedicação e participação de Roberto Isnard na ajuda aos moradores da região aonde aconteceu a tragédia, o que lhe rendeu várias homenagens. Roberto também me emocionou.

Passei a frequentar a sala de Roberto e tivemos alí longos e agradáveis papos. Era extremamente bem relacionado e tinha sempre uma história pra contar.

Certa vez fui procurado por uma colega de trabalho, que me comunicou que Roberto seria homenageado no programa “Esta é a sua vida”, comandado pelo jornalista Carlos Gaspar na TV Tupí, e gostaria que eu participasse. Claro que me coloquei a disposicão. Recebí a visita de um dos produtores do programa, passei algumas informações sobre Roberto e no final da conversa entrou em minha sala o Haya meu irmão gêmeo, que tinha ido me buscar no trabalho. Na hora esse produtor teve a idéia de convidar meu irmão para participat também do programa, pois queria fazer uma brincadeira com o Roberto. Só pra lembrar, Haya e eu somos gêmeos idênticos.Temos o mesmo timbre de voz, até nossa mãe nos confundia ao telefone e por várias vezes quando fazíamos programas de rádio juntos, e um de nós saia do estúdio por algum motivo, o outro falava pelos dois. Fomos os dois aos estúdio da TV Tupí no dia do programa como combinado. Roberto estava conosco na platéia, pois havia sido informado que o homenageado era Henning Boilesen, superintendente da Ultragáz. Carlos Gaspar abre o programa, faz todo aquele blábláblá e em vez de Boilesen chama Roberto Isnard dando ênfase a apresentação “E Roberto Isnard ...essa é a sua vida!” Aplausos e Roberto acompanhado por um dos produtores sobe ao palco e alí começa o programa .

Muitos convidados que por algum motivo tinham alguma ligação com Roberto eram chamados para homenagea-lo. Foi quando Carlos Gaspar me chamou e, em vez de eu ir ao encontro de Roberto, foi meu irmão, empurrado por um dos produtores. Haya disse algumas palavras a Roberto que imediatamente retrucou...”Mas esse não é o Lafayette”, em seguida adentrei ao palco e a platéia aplaudiu admirada. Roberto, não sei como, sabia de meu hábito de usar gravatas coloridas, e respondeu com muito humor a Carlos Gaspar, como havia distinguido minha voz, uma vez que nem minha mãe conseguia: “Foi pela cor da gravata”. Roberto Isnard é uma dessas pessoas raras de se encontrar nos dias atuais.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

1966/Blota&Sonia

O período em que trabalhamos na Rádio e Tv Record, foi muito proveitoso em muitos sentidos. Profissionalmente foi o período do aprendizado. Vínhamos do teatro, aonde fazíamos praticamente tudo. Iluminação, direção de cena, produção musical etc.etc.

Na tv é diferente, cada um desses ítens tem um profissional da área. A nossa função era a de criar e outros executavam.

No Blota Jr. Show, nossa primeira experiência televisiva, o nosso trabalho era o de sugerir entrevistas para o comandante do programa, preparar a ficha dos entrevistado com seu perfil e as perguntas que seriam interessantes de se fazer. Esse trabalho era dividido pela equipe, ficando para o apresentador o contato direto com os entrevistados especiais, tais como políticos e figuras de maior relevância.

Lembro-me de uma entrevista que Blota Jr. fez com um indíviduo de nome Aladino Felix, também conhecido como Sábato Dinotos, que dizia ter traduzido as profecias de Nostradamus. Ele era meio estranho e tempos depois apareceu nos noticiários acusado de terrorismo. Durante a entrevista, Blota teve que cortá-lo chamando os comerciais, quando começou a profetizar que “o homem de barro seria expulso e daria lugar ao homem de natal” interpretando o livro de Nostradamus, querendo dizer que Adhemar de Barros, governador de São Paulo na época, seria cassado e em seu lugar, assumiria Laudo Natel.

Bem, a verdade, é que a cassação de Adhemar de Barros aconteceu e Laudo Natel, que era seu vice, assumiu o governo do Estado de São Paulo em 6 de junho de 1966. Sábato Dinoto esteve preso no Dops de onde desapareceu .

Não me lembro quem convidou Sábato Dinotos para o ”Blota Jr. Show“, só me lembro que o” Dr.”, como era carinhosamente chamado o “chefe”, distribuiu bronca pra todo mundo.

Aconteceram passagens muito curiosas durante a nossa permanência na Record. O ambiente era de muita camaradagem entre os companheiros. Tínhamos uma associação de funcionários, que colocava a nossa disposição colônia de férias, empréstimos financeiros, vendas de produtos a preços de fabrica, em fim, quem trabalhava na Record trabalhava feliz.

Além de trabalharmos na Tv, tínhamos um programa de rádio diário, que entrava no ar por volta das 23 horas. Numa atitude pouco comum na época, o salário em espécie e em dia, era recebido durante o horário do programa de rádio. A Record era líder de audiência e tinha uma situação financeira bem saudável .

Foi lá que nasceu, numa iniciativa dos funcionários, a prática do “showbol” no espaço aonde era gravado o Circo do Arrelia. Juntavam produtores, apresentadores, funcionários de todos os níveis para, até altas horas da noite, baterem aquela bola.

Uma das lembranças que guardo daquela época, foi um sorteio que a nossa associação fez de um fusca zero, para todos os funcionários da emissora, durante uma festa de aniversário da Record. Pra variar, chamaram o casal mais famoso e respeitado da TV na época, Blota Jr e sua esposa Sonia Ribeiro, para comandarem o sorteio. Eles eram os mestres de cerimônias de todos os festivais, shows do dia 7, e foram os precurssores das famosas duplas, que até hoje são utilizadas, nos principais programas de nossa TV.

O pessoal já estava impaciente quando Blota e Sonia começaram o sorteio, que tinha muitos brindes antes de chegar ao prêmio maior: o sonho de dez entre dez brasileitos - o fusca zerinho.Depois de muito suspense, Blota anuncia: ”E o fusca vai para o número ...tal!” Todo mundo procura o número tal, e surpresa, o número sorteado era o de Sonia Ribeiro! Tumulto geral, vaias, assobios, gritos de “marmelada”, até que Blota com o microfone em punho acalma o pessoal e anuncia: “Pessoal acho justo que, como a Sonia ganhou o prêmio, ela fique com ele, mas para mostrar a vocês o quanto admiro a todos os companheiros, prometo que sábado que vem, aqui mesmo, estarei sorteando um de meus carros!” Com esse anúncio, a euforia tomou conta de todos presentes, afinal, Blota só desfilava de Mercedes Benz ! A imaginação correu solta, era conversa por todo lado, durante a semana, nos corredores era o único assunto, todos queriam adivinhar qual dos Mercedes o” Dr.” ia sortear.

Conforme o prometido, no sábado seguinte, todos reunidos no páteo e Blota anuncia o sorteio. O carro a ser sorteado adentra o páteo envolto em uma nuvem de fumaça, provocada pelo óleo colocado propositadamente no carburador pelos seus ocupantes, que eram Blota Neto, filho de Blota e Bruninho um de seus assessores. O carro, um Dodge ano 1941 que Blota havia comprado de um funcionário da Secretaria de Turismo para ajudá-lo, por este se encontrar numa situação financeira dificil . A gargalhada foi geral!

A jornalista Lyba Fridman, assessora de comunicação da Record, foi a sorteada. E o que para muitos parecia um “mico”, serviu para tirar a jornalista de um tremendo sufoco. Lyba vendeu seu prêmio para um desmanche e com o dinheiro, conseguiu quitar uma dívida na justiça, cujo prazo se expirava no dia seguinte. Sempre foi grata a Blota Jr. pela atitude que, de uma brincadeira, salvou-a de uma situação difícil.

Lyba foi também, uma das responsáveis pela divulgação de vários trabalhos que realizamos, durante os anos de ouro da bossa nova. Era colunista de rádio, tv e shows e trabalhou nas principais revistas especializadas.

Blota Jr., apesar de não termos tido uma convivência maior, foi uma pessoa que sempre admirei, assim como Dna Sonia Ribeiro, que foi, sem dúvida, a primeira dama da televisão brasileira por sua postura,classe e elegância.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

1938/Rio de Janeiro

Contam que, por volta das 23 horas do dia 28 de setembro, a gaucha de 22 anos de nome Maria de Lourdes, casada com o jornalista peruano Guillermo, começou a sentir sinais de parto. Imediatamente foi acionada a parteira da família que, em poucos minutos, chegava ao casarão da Rua Rainha Elizabeth 105, no bairro de Copacabana. Muito calma, relataram as testemunhas na época, Maria de Lourdes tranquilizava as pessoas a sua volta. Fazia questão de dizer que não sentia dor alguma, apesar das contrações. Sua barriga era bem avantajada.

Na época, o sexo do bêbe era conhecido ou na hora do nascimento, ou através de adivinhações tipo duas tesouras embaixo da almofada de um sofá, uma aberta e a outra fechada e pedia-se a parturiente que escolhesse um lugar para sentar. Se o escolhido fosse o da tesoura fechada era menino, se fosse aberta menina.

Na casa, habitada por Maria e Guillermo, o primogênito Benjamim Sandino, reinava absoluto há 1 ano e 4 meses. Com o casal, morava também o Tio José, irmão de Cecilia mãe de Maria. José havia se desquitado de Izabel, uma francesa com quem havia se casado durante o tempo que morou na França. Guillermo por conta de suas atividades jornalisticas, era correspondente do jornal Diretrizes de Buenos Aires, viajava muito e Tio José fazia companhia para Maria. Cozinheira, copeira, chofer,e babás completavam a população da casa.

Às 23.30 horas, segundo o cartório de registro da Lagoa Rodrigo de Freitas, Maria deu a luz ao primeiro filho. Sim eram 2. Quando o Dr.Saladino, médico da familia chegou, o segundo bebê se esforçava para sair, o que aconteceu 15 minutos depois. Contam que foi uma verdadeira festa. Guillermo, que regressou de Buenos Aires dois dias depois, ficou bastante emocionado. Depois da poeira abaixada, e como acontece até hoje nas melhores famílias, começou a discussão para a escolha dos nomes que seriam dado aos dois.

Maria queria que um dos filhos fosse um batizado por seus tios e, com isso, colocar num dos gêmeos o nome dele. Guillermo com suas tendências políticas, queria homenagear algum de seus ídolos. Com o primogênito, haviam resolvido da seguinte maneira: Benjamim era o nome do querido avô de Maria e Sandino era um revolucionário nicaraguense por quem Guillermo tinha simpatia. Assunto resolvido Benjamim Sandino.

Tio Lafayette e Tia Regina eram tios queridos de Maria, que fez questão de dar-lhes o filho para batismo e ainda colocar o nome do tio em um dos filinhos, no que Guillermo complementou com o nome de um poeta e revolucionário cubano de nome José Martí. Resolvido o segundo problema. Um dos gêmeos foi batizado com o nome de Lafayette José Martí Hohagen. Restava o outro gêmeo, que Maria já desgastada com tanto nome para escolher, deu a Guillermo para que ele resolvesse. Resolveu. Victor Raul Haya, nome do chefe do partido Aprista peruano, e que veio ao Brasil no anos 50 para efetivar o batizado. Mais tarde, com Guillermo assumindo as funções de nomear os filhos, vieram Simon Bolivar(que não resistiu ao parto) e Maria Adilia em homenagem a avó paterna.

Esse foi o início de tudo. Agora, ao completar 71 anos, deixo esse relato e ilustro com algumas fotos essa minha trajetória, muito dela já contada nesse meu blog de memórias. Nas fotos do “slide show” abaixo, será notada a presença do Tio José, que foi sempre o grande companheiro que tivemos até o fim de sua vida.Era o nosso Pepe, como o chamava meu pai, e José, como nós o tratávamos. Supriu a ausência do querido “papito” que, por força de profissão, muitas vezes ficava meses em viagens e que, se vivo, com certeza teria um blog aonde narraria as muitas aventuras vividas durante a sua vida.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

1969/Galeria Metrópole

Nos anos 60, a cidade de São Paulo era rica em galerias. Eram bem frequentadas como hoje são os shoppings, mas menos elitistas. Eram democráticos e sem ostentação.

Tínhamos e ainda temos, a Galeria Guatapará, Olido, Califórnia, Itapetininga, Nova Barão, R. Monteiro, Grandes Galerias (Galeria do Rock), Ipê, 7 de Abril, Metrópole e outra reminicentes desta época.

Todas ainda charmosas, aonde se encontram ítens únicos, não encontrados em nenhum outro lugar. Aliás, este diferencial as galerias ainda conservam dos anos 60. Lembro-me que comprávamos lâminas de barbear inglesas Wilkson, ou cigarros Phillips Morris com filtro de carvão , perfumes e radinhos de pilhas importados nas galerias do centro da cidade.

A Galeria Califórnia abrigava também um famoso estúdio de gravação, o Magisom, de Gilberto Martins, um dos maiores produtores de jingles do Brasil e aonde meu amigo Berto Filho, com sua incomparável voz, valorizou várias campanhas para rádio e tv. Até eu que integrava um quarteto vocal junto com meu irmão Haya e dois amigos ,gravamos um acetato no Magisom.

O grande diferencial das galerias, é que elas te levam de uma rua para outra ou seja, você faz o percursso por elas para abreviar a caminhada, e ainda usufrui das vitrines de suas lojas.

Tinha também aquelas que eram mais voltadas aos barzinhos, que proliferavam na época da bossa nova. Qualquer barzinho por menor que fosse, tinha um cantinho, um banquinho, um foco de luz e, claro, um violão. Nada de play-backs, como hoje se vê nos botecos da cidade. Começavam a trabalhar por volta das 18 horas e o cast de músicos era bem grande. Havia uma certa rotatividade. O mesmo músico, tocava em vários barzinhos por noite.

Na Galeria Metrópole, Plinio Marcos lançou sua primeira peça no “Ponto de Encontro”, um mixto de livraria e barzinho: “Dois Perdidos Numa Noite Suja”. Na platéia, pasmem, apenas 6 espectadores. Graças a absurda repressão de nossa ditadura, este incrível trabalho do Plínio, tornou-se texto obrigatório nas platéias brasileiras. A mordaça virou contra o repressor.

Um dos pontos mais frequentados era o Chá Moon, uma casa de chá charmosa e bem frequentada. A partir das 3 horas, começava o movimento. Era um ambiente calmo, excelente para um primeiro encontro, o tão ingles chá das 5, ou mesmo o “scotch”das 6.

Na Metrópole, o forte mesmo eram os barzinhos. Havia pelo menos uns 25. Lembro-me de alguns como o Barroquinho, Barquinho’s Drink, Esquilo’s, Le Club, e o mais famoso de todos,“O Jogral”, do Luiz Carlos Paraná. Lá desfilavam ícones como Leila Diniz, Caetano Veloso, Chico Buarque, Jorge Ben, e a maioria dos músicos, que ao sairem de seus trabalhos iam dar uma “canja” - lembrem-se, eles ainda não viviam de sua arte, todos em início de carreira. Eram grupos inusitados e davam um verdadeiro show de bossa e jazz. A platéia, quase sempre formada por colegas de trabalho.

Tive ainda a oportunidade de participar de um pocket show com Lennie Dale e o Sambalanço Trio, fazendo a iluminação do show. Fomos chamados as pressas e ainda nos deram a incumbência de conseguir um patinho, sim um filhote de pato, pois o Lennie num de seus números cantava “O Pato”, e tinha criado uma ação que, ao iniciar a música usava a pequenina ave. Um garçom trazia uma bandeja com uma taça de “dry martrini”com o patinho dentro, coberto com um guardanapo, ao passar pelo Lennie, ele abruptamente levantava o guardanapo e exclamava “O Pato!” e continuava...vinha cantando alegremente quemquem... O duro foi conseguir o tal patinho. Só achamos no Mercado Central. Mas valeu pois de fato deu um efeito prá lá de especial ao número.

E foi ainda na Galeria Metrópole, no” Jogral”, que Oscar Petterson deu uma “canja unforgettable “. Chegou de repente, levado não se sabe por quem, causando o maior alvoroço. Geraldo Cunha cantava e tocava o violão quando o canadense, sem nenhuma timidez, sentou-se ao piano e aconteceu talvez a maior jam-session que a cidade teve notícia.




terça-feira, 15 de setembro de 2009

1957/Migueleto

Outro dia, lendo um post no blog de meu amigo Marcio Macedo www.newyorkibe.blogspot.com, em que aborda o tema “moda”, fui levado de volta ao tempo em que morava em Manhattan .

Ansioso por encontrar um patrício e amenizar assim as saudades que sentia de casa, ficava observando as vestimentas das pessoas nas ruas, cafeterias, elevadores , metrô. Nos homens procurava notar o feitio de suas roupas e nas mulheres além das roupas o feitio de seus corpos. E foi assim que encontrei alguns brasileiros que por lá andavam e até fiz algumas boas amizades.

Na época, no Brasil, a moda masculina tinha uma caracteristica: o corte acinturado tanto para camisas como para paletós. As mangas dos paletós era mais curtas para que os punhos das camisas , quase sempre ornamentados com vistosas aboaturas, pudessem aparecer. Já lá nos “states”os paletós e blaisers tinham um corte reto com 3 botões e duas aberturas na trazeira. Abotoava-se os dois botões de cima para baixo ficando o terceiro livre. As mangas tinham normalmente o comprimento dos braços, o que tornava para mim uma dificuldade comprar algo sem precisar reformar, uma vez que com minha estatura média de brasileiro, as mangas de camisas ou paletos quase chegavam nos joelhos.

Às mulheres americanas com certeza faltava o charme e a graça da mulher brasileira, além do que pareciam tábuas, tal a falta das curvas tão notadas em nossas compatriotas. Acho que era até mais fácil distinguir uma brasileira no meio delas, do que achar um brasileiro no meio daqueles branquelos de pernas longas e braços compridos.

Na minha busca “trombei” com o mineiro Migueleto. Não me lembro de seu primeiro nome, talvez até porque ele nunca o tenha mencionado, mas o seu paletó cinturado e os punhos de sua camisa ornamentados com vistosas abotoaduras, o identificaram como brasileiro na minha primeira olhada.

Aconteceu numa tarde quando caminhava pela Broadway em direção a estação do metrô da rua 72, e ví o tipo caminhando e seguindo com olhares provocantes todas as mulheres que por ele passavam (mais uma caracteristica brasileira). Vestia um terno risca de giz acinturado, abotoaduras vistosas e não tive dúvidas fui logo indagando com tom afirmativo “você é brasileiro?” Sou ! veio rápida a resposta e dai o inicio de uma grande amizade, que durou por todo o tempo em que lá morei.

Migueleto era fisicamente um tipo bem diferente. Muito feio para qualquer padrão de beleza. Seu cabelo lembrava um rato pelado, desengonçado e magrelo.

Sem dúvida tinha um charme que tocava as mulheres. Quando alguem combinava uma “party”no final de semana, tinha que convidar Migueleto...e suas amigas. Era sucesso garantido, a ponto de numa dessas, convidaram o próprio e suas amigas, mas esqueceram de convidar um número razoável de amigos. Resultado? 30 mulheres e 12 homens num apartamento novaiorquino de 50 metros . Fracasso total da festinha pelo total desequilibrio das partes. Nessa festinha particularmente, tive que assumir o interfone, e a cada chamado que recebia do portão de entrada, quando a voz era feminina perguntando por Mr. Migueleto já respondia “we got no Mr. Migueleto in this apartment”, na esperança de salvar a noite. Mas foi tudo em vão, pois as convidadas do amigo que chegaram a entrar na festinha, ao reparar o “score” iam, aos poucos e sorrateiramente se retirando daquilo que para elas era um verdadeiro”mico”.

Numa outra ocasião, durante um evento no Central Park que apresentava um festival de quartetos vocais o“Barber Shop Quartet Festival”, Migueleto aprontou mais uma. Telefonou-me fazendo um convite - ”Carioca você vai hoje ouvir o melhor da música tradicional americana. São quartetos vocais exclusivamente formados por barbeiros e cantam muito!” Eu me entusiasmei, e ansioso me dirigi ao encontro do amigo, que morava a poucas quadras de minha casa, no west side, em um prédio meio decaido que, naturalmente, não existe mais. Esperei como que uns 30 minutos até que desisti e fui sozinho para o Central Park. O local eu já conhecia, pois ficava próximo do rink de patinação que eu costumava frequentar. Cheguei com o festival já iniciado e bem concorrido. Muita gente. Me arrumei e curti . Foi de fato uma tarde inesquecível, pessoas de vários cantos do país demonstrando suas qualidades musicais, sendo que na realidade, eram todos de fato barbeiros. Era uma tradição. Não sei se ainda existem esses festivais. Enriqueci minha discoteca com vários lps do gênero, depois daquela apresentação. Mas e Migueleto? Na minha volta para casa, ao sair do Central Park, observei um grupinho de umas 10 pessoas, a maioria mulherers que riam, davam gritinhos, cena comum que não chamaria a atenção de nenhum morador daquela cidade, fui me aproximando e me deparei com meu amigo Migueleto acompanhado de um macaquinho amestrado, que fazia graça e truques. Não entendi nada, até receber do amigo a justificativa pelo “cano”e o que representava todo aquele circo. “Acontece meu amigo Carioca, que a mulher americana é louca por qualquer bichinho de estimação, e uma amiga dona desse bichinho, me pediu um grande favor de dar uma voltinha para que ele tomasse um ar. Não podia negar-lhe o pedido. O que não esperava era ter todo esse sucesso. Fica tranquil, que estamos com a noite garantida”.

Esse era meu amigo Migueleto. Um sucesso com as mulheres, e que com sua tremenda “cara de pau “ conseguia abrir várias portas. Foi ele quem me apresentou a um dos maiores músicos de jazz que tive oportunidade de conhecer. O baterista e lider do grupo The Messengers , Art Blakey. Foi num barzinho no Village, aonde Art Blakey se apresentava todos os sábados, a partir das 5 horas da tarde. Pareciam amigos de longa data. Não entendia como o músico americano conseguia se comunicar com alguém falando tão mal o inglês. Tínhamos sempre uma mesa reservada quando das apresentações do grupo de jazz de Art Blakey. Migueleto chegou a ir umas 2 ou 3 vezes, mas eu me tornei assíduo frequentador. Sozinho ou com algum amigo que curtisse o som do jazz. Por uma incrivel coincidência, muitos anos depois, creio que no final dos anos 80, o músico americano veio ao Brasil e ficou hospedado na casa de minha prima Baby Consuelo, hoje Baby do Brasil, de quem tinha se tornado grande amigo.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

1955/Niteroi

Na minha infância/juventude, passei vários períodos de férias escolares em Niteroi, na casa de minha tia Esther, irmã de minha avó materna. Ela era funcionária da Câmara dos Deputados que, na época, tinha sua sede no Rio de Janeiro porisso, assídua frequentadora das famosas barcas, que faziam o trajeto hoje substituido pela maravilhosa Ponte Rio- Niteroi.

Morava na Rua Cleto Campelo em Icarai, numa casa bem espaçosa, muito confortável, com seus dois filhos Luiz Carlos de Carvalho Cidade (nome que deu em homenagem a Luiz Carlos Prestes) e Humberto de Carvalho Cidade (o criador da Loteria Esportiva no Brasil) e sua irmã, a beata Senhorinha de Carvalho e Silva. Tempos depois vieram morar na casa , Bernadete, Angela e Ana Maria as netas, frutos de casamentos mal sucedidos dos filhos.

Em sua casa trabalhava Maria, que já fazia parte da familia, aliás acho que sempre fez. Maria era uma governanta que cuidava praticamente de tudo. Fazia um bolo de aipim e um pudim de tapioca como ninguém. Teve um filho de nome Alcino, que também acabou se integrando a familia Cidade. Uma coisa sempre me intrigou: Quem era o Sr. Cidade? Havia um mistério em torno do pai de meus primos. Ninguém tocava no nome dele. Naquela época, a educação não nos permitia perguntar sobre assuntos de adultos e, mesmo depois de adultos, nunca tivemos acesso a essa informação. Nunca procuramos saber, em respeito aquele silêncio.

A família Cidade era bem conceituada na sociedade de Niteroi. Eram sócios nos principais clubes , o Icarai Central e, lógico, o Iate Clube. Os irmãos frequentemente apareciam nas colunas sociais locais, ora em eventos sociais de gala, ora como participantes dos blocos carnavalescos bem tradicionais na época. Eram conhecidos pelas tremendas confusões que faziam , causadas pelo excesso de alcool.

Lembro-me que, como éramos garotos, não participavamos desses programas carnavalescos, mas ficávamos, meu irmão Haya e eu, esperando a chegada do primo Carlos, e nos divertíamos muito com o estado deplorável que chegava na volta para casa. Enquanto esperávamos o carnaval terminar, nossa diversão era ir a praia com Alcino e as pequenas primas, que o tempo todo nos rodeavam.

Numa das temporadas que passamos em Niteroi , fomos levados pelo primo Humberto ao Clube Central, onde haveria um grande baile com orquestra. Na mesa dos Cidade, além de Humberto , alguns amigos dele, Haya e eu. O pessoal da mesa já meio “ alto”. Bebiam Gin com Tônica e cerveja. Humberto, como de costume, queria aprontar alguma “maldade”conosco. Era sua diversão .

Além de nos deixar experimentar as bebidas, nos fez repetir e repetir, divertindo-se muito ao nos ver alcoolizados . Quando dei por mim, estava sentado tocando piano com a orquestra, que abrilhantava o baile.

Não faço idéia do que toquei naquele piano, mas não devo ter -me saido muito mal, pois vários dias depois, ainda era cumprimentado por pessoas que nunca tinha visto antes, e que comentavam a minha performance daquela noite. Foi meu primeiro porre. Aos 16 anos. Induzido pelo primo Humberto.

O dia seguinte foi terrível. Tia Esther fez um sermão daqueles. As priminhas, que na época tinham entre 3 e 6 anos, se divertiram com nosso estado lastimável, insufladas pelos pais.

O primo Humberto foi responsável por várias aventuras vividas em minha juventude, principalmente quando passava minhas férias em Niteroi.

Gostava de apostar em cavalos, aliás, chegou a ter uma égua que corria no Jockey Clube do Rio de Janeiro, a Tarasca. Mais para pangaré do que para uma égua campeã. Chegou a ganhar algumas corridas, mas isso acontecia quando disputava com cavalos de nível bem baixo.

Certa ocasião, havia feito uma “ aposta acumulada” com um “bookmaker”, e ficou dependendo do vencedor do último páreo. A casa da Cleto Campelo entrou na torcida, até Tia Niná (a beata) com seu “terço”, rezava pedindo a seus santos protetores que vencesse o cavalo que daria ao primo Humberto um belo prêmio em dinheiro. E o cavalo venceu! Foi uma gritaria total. Muita alegria. Muita comemoração.

Mas, para o primo Humberto, a comemoração precisava de mais.

Havia um prostíbulo em Niteroi chamado “Churrascaria”, que ficava distante de Icaraí, acho que no “Saco de São Francisco”. Humberto resolveu que iria comemorar conosco, Haya e eu lá na Churrascaria, e para lá fomos. Devia ser um assíduo frequentador, pois foi recebido com todas as pompas e circuntâncias.

Eram muito boas as férias em Niteroi. Voltei esse ano, na semana santa, comde minha mulher Ruth, levado por meu filho Alexandre, minha nora e netas, depois de quase 50 anos . Cheguei pela Ponte Rio-Niteroi, sem barcas, sem os primos Humberto e Carlos, que se foram prematuramente, e sem tempo de rever a Cleto Campelo . As primas Ana Maria e Angela, já faz um bom tempo que não as vejo.

A prima Bernadete também ficou um tanto distante, depois que seu pai o primo Carlos se foi, mas tivemos bastante contato nos anos 60/70, quando morou em São Paulo com seu grupo “ Os Novos Baianos”, época que Riroca nasceu e ela hospedou-se em minha casa.

Não era mais a Bernadete Dinorah de Carvalho Cidade. Passou a Baby Consuelo e ficou Baby do Brasil. Chegamos até a jogar um futebolzinho com seu marido Pepeu Gomes, e os amigos, Paulinho Boca de Cantor, Gato Felix e o resto da troupe.

Saudades da dupla de primos Carlos e Humberto companheiros de muita diversão e muita confusão.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

1956/Cine Jussara


Tempos atrás, enquanto não se completava 18 anos, a gente se via impedido de fazer várias coisas e claro, era sempre o que a gente mais queria fazer.

Havia um salão de bilhar no bairro de Santa Terezinha, na rua Conselheiro Moreira de Barros, em cima da Padaria Magna, que o Silvio, filho de “seu” Ferreira (um dos donos da padaria) tomava conta. Silvio cantava arias de operas, enquanto preparava um sanduiche de mortadela na chapa ou um sanduiche de churrasco, as grandes atrações dos lanches da casa. O salão de bilhar era muito bem montado .Tinha umas 6 mesas de altíssima qualidade, tacos de primeira , enfim era muito bom.

Silvio tinha um ajudante de nome Mario, que tinha um defeito fisico. Meio corcunda, seu corpo curvava-se para baixo, se locomovia com uma certa dificuldade. Era ele quem colocava as bolas na mesa,quem marcava o tempo no quadro e o principal, era o depositário das apostas feitas durante os jogos de” vida”, 21, disputas de partidas normais e outros, que sempre apareciam. Mas, a grande responsabilidade em seu trabalho, era a de impedir que menores de 18 anos entrassem naquele “antro de vício e perdição”, como rotulavam a maioria das mães do pedaço, inclusive a minha.

Era comum ver mães, namoradas, esposas subindo as escadas que davam acesso ao salão Magna, para tirar seus filhos, namorados e maridos das mesas de jogos infindáveis, principalmente quando o jogo era a dinheiro. Eram quilômetros que se andava em volta daquelas mesas, com a esperança de, na próxima, ganhar ou de continuar a ganhar mais do que já havia ganho. Muitas histórias e mais histórias que se ouvia por alí.

Contam que certa vez, subiu ao salão um jovem que havia passado para tomar um “rabo de galo”com o Silvio, antes de se encaminhar a igreja de Santa Terezinha alí pertinho, aonde se casaria.” Mauricio Cabo de Aço” era assíduo frequentador do bilhar. Aquele apelido ninguém sabia porque. Jogava muito bem futebol.Canhoto no futebol mas destro no bilhar. Chegou a treinar no juvenil do São Paulo,quando o time habitava o Canindé. Um “olheiro”o havia visto jogar no time da Livraria Brasiliense, aonde trabalhav, e fez o convite, mas os constantes atrasos nos treinos por causa do bilhar, acabaram encerrando prematuramente a carreira daquele que poderia ter sido uma estrela de nosso futebol.

Mauricio tomou o seu “rabo de galo”com o Silvio, quando se despedia dos amigos para se dirigir ao seu próprio casamento, em sentido contrario entrava no salão um fulano do Mandaqui, que havia perdido uma grande soma de dinheiro para o Mauricio no dia anterior. Postou-se a frente como que impedindo sua passagem e desafiou “Ontem foi seu dia mas hoje eu quero a forra”. Mauricio argumentou que estava a caminho da igreja para casar, que poderiam marcar uma data para uma nova disputa. Mas de nada adiantaram as explicações. O fulano queria naquele momento. Desafiou, ofendeu, xingou até que Mauricio não conseguiu se segurar e gritou “Mário, monta a mesa 5”, mesa esta, que conhecia mais que a sua própria casa. Todas as “descaidas”e “mancadas “da mesa tinha sob seu domínio.

O casamento estava marcado para as 7 horas da noite. Mauricio havia chegado ao salão por volta das 6, e já eram 7h30 quando Silvio resolveu interferir e acabou com o jogo, salvando um casamento que poderia ter, como a carreira futebolistica de Mauricio, acabado prematuramente. Mauricio depois confidenciou a Silvio, que teve que deixar o fulano ganhar, para poder se ver livre e chegar a tempo na igreja.

Todos os jovens , hoje senhores, companheiros daquela época, tem uma história pra contar das aventuras vividas no Salão de Bilhar da Magna. A gente contava os dias para, ao completar os 18 anos, peitar o Mário e ordenar “Mário monta uma mesa aí!”

Outros programas, assim como a mesa de bilhar, também eram esperados com muita ansiedade, como por exemplo, entrar no Cine Jussara, mostrar a carteira da escola, e deixar o porteiro frustrado por não barrar mais um que queria assistir os filmes de Martine Carol, atriz francesa, cujo dote maior de interpretação, era mostrar os seios desnudos.

O Cine Jussara, ficava na Rua Dom José de Barros, era frequentado por senhores e o cenário preferido por moleques como nós na época, para batizar a entrada aos 18. Difícil encontrar uma senhora ou moça na platéia. Normalmente, quando o filme se encaminhava para seu final, era comum notar o público mais adulto, se levantar e sair antes que as luzes se acendessem. Nós queríamos ficar até a última legenda, na esperança que alguma imagem extra pudesse nos brindar.

Os jovens de hoje, já não precisam mais esperar os 18. Se ligarem TV para assistir aos BBBs da vida, ou alguns canais a cabo, podem descobrir dentro de suas próprias casas desde a mais tenra idade, os segredos e emoções que a nós só foi permitido na maioridade.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

1969/Rádio Apolo


São poucas pessoas que conheço, que ouviram falar nessa emissora de rádio. Até, talvez, se lembrem da Rádio Industrial Paulista. Na verdade trata-se da mesma emissora. Rádio Industrial Paulista, tinha sua sede no bairro de Pinheiros e sua programação era voltada à colonia nipônica. Sucessos musicais, noticiários e anunciantes de produtos orientais preenchiam os horários da emissora, que era dirigida e de propriedade de japoneses. Quando passou a se denominar Rádio Apolo, fazendo alusão lógica às naves espaciais do Projeto Apollo durante o governo Kennedy, mudou de endereço e de personalidade. Foi para a Praça Oswaldo Cruz e eliminou a programação nipônica. A pequena Rádio Industrial Paulista preparava-se para crescer.

Foi o amigo Helio Cordeiro, com excelente passagem como repórter pela Jovem Pan e com quem já havíamos trabalhado em 1962 na Midas Propaganda, que nos encaminhou a tal Rádio Apolo, que precisava de uma sustentação em sua programação noturna e passava como toda a emissora, por uma reestruturação. A dupla dinâmica entrava em ação mais uma vez!

Claro que não era nada atraente a proposta financeira oferecida pelos administradores da emissora.

Não havia salário. Nós é que tínhamos que buscar o nosso ganho, mas em compensação, nos 3 primeiros meses, não teríamos que repassar nada a rádio. Eram permutas e mais permutas, pois tínhamos que mostrar aos novos anunciantes que o programa era super procurado por anunciantes diversos. Permutas de butiques, restaurantes, oficinas mecânicas, cinema ao ar livre (na época muito em voga), enfim, o que viesse era bem vindo. Difícil, era depois repassar tudo aquilo e fazer dinheiro, pois as crianças estavam crescendo e com elas as despesas aumentando.

Meu irmão Haya deu a idéia de fazermos um programa que desse opções de entretenimento para a semana, que abrisse espaço ao ouvinte solitário e executasse o melhor da música brasileira.

Funcionou. Tínhamos uma agenda de entretenimento bem atual, a seleção musical por motivos óbvios, não poderia ser melhor. O ouvinte solitário encontrou no “Último Programa” um cantinho amigo para suas solicitações. Este último segmento do programa era interessante, pois as pessoas que alí chegavam, não traziam dramas nem desgraças, apenas desabafos e vontade de encontrar entes que não viam há muito tempo. Eram figuras curiosas que prendiam a atenção de nossa minúscula audiência, e isso, mais por causa da baixa potência de seus transmissores do que pela qualidade de nosso programa, modéstia a parte.

O programa ia bem, havia até uma perspectiva de termos outros horários na programação, mas... no final do ano de 1968, mais precisamente em dezembro, foi instituído o Ato Institucional número 5, que determinava a censura total à imprensa e deu início ao fechamento de muitas emissoras de rádio em todo o país. Claro que São Paulo foi premiado, e, com vários tipos de justificativas, a ditadura militar encerrou as atividades de emissoras que, segundo eles, podiam difundir “atos nocivos à nação”.

Por outro lado, passaram a conceder autorizações para a instalação de emissoras que transmitissem em “Frequência Modulada” e que só executassem músicas. Nada de notícias. Nada de jornalismo.

E foi assim com a pequenina e inofensiva Rádio Apolo que também foi, como muitas outras, fechada pela ditadura militar. E o nosso inocente programa de entreterimento e interatividade com o ouvinte, tão em voga nos dias atuais, acabou por se tornar um perigo a "segurança nacional".

domingo, 16 de agosto de 2009

1965/Ary Toledo

Ary Toledo era um personagem que transitava com frequência pelo Teatro de Arena. Ali começou sua carreira como ator, aliás como varredor, depois de alguns dias insistindo com Boal para que lhe desse uma chance, largou a vassoura. Fez uma ponta em “”Revolução na América do Sul”, mas o objetivo era mesmo mostrar suas composições, na maioria sátiras políticas recheadas de palavrões. Para ele, a partir de duas pessoas, já tinha público suficiente, para empunhar seu inseparável violão (era sofrível no instrumento) e mostrar algumas de suas obras. Não era cantor, mas sabia “dizer”como ninguém, as letras de suas composições. Ríamos bastante com suas interpretações, sempre cheias de muitas caretas.

A certa altura, Ary já tinha um repertório pronto para um show solo, quando numa conversa informal, resolvemos fazer uma apresentação sua numa segunda-feira no Arena, data semanal que dedicávamos às “Noites de Bossa”. Claro que foi um sucesso!

A partir daí, rodou por muitos inferninhos, circos e teatros no interior com suas apresentações

Quando em 1966, um anos depois da estréia na TV Record do programa “O Fino da Bossa”, Ary levantou a platéia e teve que voltar 5 vezes para o “bis”, não havia mais dúvidas sobre o seu talento e o rumo que tomaria a sua carreira. Seu primeiro grande sucesso “Pau de Arara”, uma caricatura do nordestino que vem para a cidade grande, tocava mais que os Beatles nas emissoras de rádio. Depois vieram “Canção do Subdesenvolvido”, " Descobrimento do Brasil” e várias sátiras políticas, que lhe renderam várias prisões e cortes de censores nos programas de tv que participava.

Com toda a esta verve cômica, Ary foi enriquecendo suas apresentações com piadas, que o tornaram o maior contador de piadas de todos os tempos. Dizem que seu acervo coleciona mais de 30 mil.

Em 1982 tive o prazer de te-lo em meu projetoJornalfone”, aonde gravava suas incríveis piadas para o “Disque Piada”. Chegava em seu “Fusca” prateado (na época ele cabia em um), e até chegar ao estúdio, que ficava nos fundos de uma casa na Rua Barão do Triunfo no Brooklin, eram dezenas de piadas novas que ia contando. Entrava no estúdio e ficava várias horas gravando, sempre de bom humor e orgulhoso pelo trabalho pioneiro, que era contar piadas ao telefone.

Ary hoje roda o pais inteiro com seu show. Provavelmente tenha sido o precursor no Brasil do“StandUp”, o espetáculo de comédia feito por apenas um humorista, tão em voga nos dias de hoje.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

1985/Jornal da Rua


Havia feito um trabalho na TV Bandeirante, no departamento de eventos especiais, que na época era comandado por Caetano Zama, quando recebi a notícia de que o departamento seria desativado. Coloquei a cabeça para trabalhar em um novo projeto.

Aliás, o convite para trabalhar nesse setor da TV Bandeirantes, partira do amigo Ivan Magalhães, que notara o nosso estado emocional com o desfecho do Jornalfone, fato que já contei em post publicado aqui em meu blog.

Morava para Rua Pamplona há pouco tempo, mas já vivia naquela região desde 1970, quando montei meu escritório de assessoria de imprensa e tinha vários amigos na região. Gostava de conversar com os vizinhos do escritório, de casa, costumava fazer minhas compras na própria Pamplona, prestigiando o comércio local. Andava de ponta a ponta na rua, desde a av. Paulista até a rua Estados Unidos.Conhecia cada loja. Meus filhos estudavam no Colégio Assunção, minha agencia bancária, o supermercado, o cinema, lojas de roupas, de discos, enfim tudo que precisasse encontrava na Pamplona e gostava da comodidade de ter tudo ao meu redor.

Percebi que muitos moradores, não sabiam o que tinha tão perto de suas casas. Foi aí que surgiu a idéia: - “Vou fazer um jornal de bairro, que destaque o comércio e os moradores da Rua Pamplona”. Minha mulher, que na época trabalhava em uma produtora de cinema, achou o filão interessante e se propôs a me ajudar nesta empreitada. Demitiu-se do emprego e embarcou comigo nesse novo sonho.

O primeiro passo foi fazer um layout moderno, pois os jornais de bairro na época eram tamanho standard, mal diagramados e mal impressos. Enquanto Ruth cuidava do visual e nós juntos do editorial, saí a campo para fazer uma pesquisa entre os comerciantes, e saber o que achavam da idéia. Aprovação total!

A proposta do primeiro número era um “tablóide” com oito páginas, mas o número de anunciantes era grande. Tivemos que sair com doze. Um deles, que estava inaugurando uma loja de revelação de fotos em 1 hora, na época, uma novidade, comprou a página dupla central do Jornal da Rua Pamplona.

Começamos distribuindo cinco mil exemplares nas residências e comércio, no quadrilátero que compreendiam a faixa da av. Paulista até a Rua Estados Unidos e da Avenida 9 de Julho a av. Brigadeiro Luiz Antonio.

Em pouco tempo saímos do escritório improvisado em casa, para um conjunto comercial na mesma Rua Pamplona. De quinzenal as edições passaram a semanais e, rapidamente,já era o “Jornal da Rua Jardins”, com a distribuição atravessando a Avenida 9 de Julho e chegando na Rua Mello Alves.

No jornal fizemos entre outros o lançamento do Mc Donalds da Paulista, da danceteria Up&Down, da Ag.Banespa Pamplona, e também muitos eventos para a comunidade, com o apoio dos comerciantes e de grande clientes como Coca Cola, Casas Bahia, Banco Itaú, Pão de Açúcar e outros.

Os eventos eram realizados na própria Rua Pamplona entre a Al. Lorena e Rua Guarará.

Fato curioso é que um mês após ter lançado o “Jornal da Rua Pamplona”, meu irmão Haya se entusiasmou e lançou o “Jornal da Rua Joaquim Floriano”, também com muito sucesso. Tempos depois, objetivando aumentar nossa tiragem e atingir uma área maior, unificamos os jornais, que passou a ser simplesmente “Jornal da Rua”. Nossa tiragem já atingia 40 mil exemplares e avançávamos em áreas como Pinheiros e Moema. Modestamente estávamos fazendo escola. O Estado de São Paulo lançou na época um suplemento intitulado “Seu Bairro”, cobrindo as mesmas regiões e com as mesmas características que o nosso Jornal da Rua. Talvez como faltasse a eles aquele a vivência que eu e Haya tínhamos nas regiões não tiveram sucesso. Continuamos crescendo.

Depois de três anos, reunindo a comunidade todo segundo domingo do mês para realizar o Brincando na Rua, tivemos que parar a atividade, pois o fato de fechar uma via como a Pamplona durante toda a manhã de domingo, começou a gerar problemas de trânsito da região.

Nossos eventos saíram das ruas e passaram a ser feitos no Parque do Ibirapuera, no período de férias. Em Janeiro o “Verão no Parque” e em Julho “Férias no Parque”. Instalávamos no estacionamento do MAM paredes de Alpinismo, sala de musculação, palco para aulas de aeróbica, além das atividades para as crianças.

Os moradores da Pamplona sentiram falta daquelas manhãs, onde amigos se encontravam e pediam a volta dos domingos de brincadeira. Para tendê-los, fizemos contato com o Banco Itaú, que gostou da idéia e, além de ceder seus estacionamentos (Pamplona com esquina Caconde, Joaquim Floriano, Rua dos Pinheiros e em Moema), patrocinava todos os custos do evento. Assim fez também o Pão de Açúcar com as lojas de Moema e Itaim Bibi. A Coca Cola dava suporte, além da farta distribuição de refrigerantes. Foi um trabalho bastante gratificante que integrava a comunidade e criava uma boa oportunidade de convivência das famílias e amigos nestas regiões.

Outro destaque do jornal era a coluna “Eu sou da Rua”, que apresentava aos leitores seus ilustres, famosos e ou mesmo curiosos vizinhos. Escritores famosos, músicos, pessoas que viviam na região há muito tempo, contavam suas histórias e seu amor pelo bairro.

O trabalho de utilidade pública foi o grande diferencial do Jornal da Rua. As reivindicações dos moradores e comerciantes locais eram encaminhadas as autoridades competentes e resolvidas rapidamente. Eram pontos de ônibus que mudavam de lugar para facilitar a vida de escolares, solicitação de iluminação em ruas escuras, postos policiais, e até a mudança da denominação da subprefeitura de Pinheiros, na época Administração Regional de Pinheiros, que passou a Administração Pinheiros-Itaim Bibi, mudança feita pelo então prefeito, Janio Quadros.

Muitos políticos, candidatos nos procuravam e, evidentemente, a maioria, só quatro anos depois íamos rever. Mas não nos negávamos a recebê-los. Atender a seus pedidos ficava estritamente ao nosso critério e a interesses da comunidade.

Aos poucos e depois de mais de 12 anos de vida, as coisas começaram a ficar difíceis para manter nosso projeto. O papel encareceu demais e os comerciantes locais passavam por dificuldades, o que nos obrigou a encerrar as atividades, mas com a certeza do dever cumprido.

Hoje, ao ver nas esquinas e faróis os tablóides tão semelhantes ao nosso Jornal da Rua, sinto saudades, mas também uma ponta de orgulho pelo ineditismo desta idéia.

A propósito, o Jornal da Rua foi fundado em 8 de Agosto de 1985 há 24 anos.

Na foto acima, o ex- prefeito Janio Quadros examina o Jornal da Rua na residência de meu irmão Haya,junto com Rames Zugaib, então presidente do Conseg-Itaim e o vereador Andrade Figueira.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

1965/Plinio Marcos



Durante o período em que ocupamos o Teatro de Arena, nos anos 60, quando produzíamos as famosas “Noites de Bossa”e “ Noites de Jazz”, tivemos a oportunidade de conhecer e conviver com muitos atores, atrizes e autores de vanguarda, que por ali circulavam. Alguns marcaram seus nomes na história da dramaturgia brasileira, como Gianfrancesco Guarnieri, Augusto Boal ,Dina Sfat, Paulo José, Claudio e Sergio Mamberti , Jacques Lagoa, Plínio Marcos e muitos outros. Com o sucesso das novelas, muitos viraram superastros, outros direcionaram suas carreiras para a publicidade, alguns continuaram no mundo do teatro e também teve o time dos que desistiram.

Era costume do pessoal do Arena freqüentar o bar Redondo, que até hoje existe nas esquinas da Ipiranga com a Theodoro Baima. Ali, sentados nas mesas do bar, peças teatrais foram combinadas, textos foram escritos e elencos formados. O Bar Redondo era, sem dúvida, a extensão do Arena.

Foi numa daquelas mesas que conheci Plínio Marcos. De jeito desengonçado, fumando muito, desbocado e relaxado nas vestimentas Plínio era uma figura. Com gênio e personalidades fortes, era muito respeitado pelos colegas da classe teatral.

Nessa época trabalhava na TV Tupi, no setor de almoxarifado ou tráfego, não me recordo bem, e suas obras começaram a aparecer, principalmente pela censura e ele rotulado pela mídia como o “escritor maldito” “o boca suja” e vários outros adjetivos.

Reencontrei Plínio Marcos no final dos anos 80, trazido pelo amigo Walter Silva, para participar do nosso futebolzinho, que era jogado religiosamente aos sábados no campo de “society “de terra batida do Colégio Santa Cruz.

Mais gordo, mais famoso, mas, continuava irreverente, desbocado e polêmico. Difícil era o jogo, em que estando presente, não saísse uma discussão, esquecida automaticamente, ao final da “pelada”.

Em 85 fundei com minha mulher Ruth, um jornal de bairro e entre os nossos colaboradores tive Plínio Marcos. Tinha uma coluna sobre esoterismo. Ele mesmo me pediu para ter aquele espaço e divulgar seu trabalho. Não reivindicou nada em troca e eu me senti honrado em tê-lo como colunista do Jornal da Rua.

Certa vez, no começo dos anos 90, ia participar de uma feira esotérica no Anhembi e ligou para me convidar para a inauguração. Fazia questão que eu fosse com Ruth minha mulher, também ligada aos assuntos esotéricos. Por algum motivo, ficamos impedidos de comparecer a inauguração da tal feira.

No dia seguinte, Plínio me ligou nervoso, me dando uma tremenda bronca, falando todos os palavrões que seu extenso vocabulário era conhecedor, sem ao menos deixar que eu explicasse o motivo de minha ausência. Antes de bater o telefone na minha cara, ainda avisou “ E não escrevo mais naquela porra de jornal! ”

Sumiu o meu amigo. Nem no futebol ia mais. Liguei para o Walter, que justificou que ele andava muito nervoso, mas que, pelo que conhecia do Plínio, logo voltaria a falar comigo. Ainda liguei para ele umas duas vezes sem sucesso.

Em 92 durante uma “pelada” com amigos em minha chácara em São Lourenço da Serra sofri um acidente vascular chamado de “Síndrome da Pedrada”, que, segundo o ortopedista que me atendeu, deixa em você a nítida impressão de ter levado uma pedrada na perna. Resultado: perna engessada e imobilidade de mais de 30 dias.

Passava o tempo assistindo TV, ouvindo rádio e lendo livros e jornais. E foi numa leitura de jornal que vi o anúncio do Clube de Criação de São Paulo, sobre um concurso para locutores de comerciais chamado “Ponha a Boca no Microfone”.

Pedi a minha secretária no Jornal da Rua, que mandasse um mensageiro até o Clube de Criação e me trouxesse a ficha de inscrição, gravei uma fita cassete com o texto indicado e mandei. Uns 40 dias depois, já sem o gesso, fui receber o prêmio. Havia sido um dos escolhidos com direito até a um trabalho para a Caloi.

Quando ainda saboreava a conquista, que espantou vários amigos, que me perguntavam se aquele que ganhara o prêmio era um de meus filhos, recebo uma ligação do Walter Silva me passando um recado. Plínio estava com um monólogo no Teatro Cultura Artística, e havia deixado na bilheteria dois ingressos para mim e Ruth.Claro que fomos!

Para nossa surpresa durante o monólogo, muito engraçado e cheio de histórias inusitadas, Plínio de repente, começa a improvisar e inclui no texto uma homenagem pelo fato de eu, com 54 anos, ainda ir em busca de atividades novas, já que nunca havia feito locução comercial . Do teatro, ainda fizemos um tour com Plínio pela noite paulistana oferecendo seus livros, como era o seu costume.

Plínio Marcos morreu em 19 de novembro de 1999 aos 64 anos de idade. Era santista, mas seu clube do coração era o Jabaquara da cidade de Santos.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

1962/Adhemar Ferreira da Silva


Ao longo de meus 70 anos, tive o privilégio de conhecer muitas pessoas com quem me identifiquei, e que considero especiais. Com algumas tive ligações profissionais, com outras, foram relacionamentos de amizade e admiração. Pessoas que fizeram parte de histórias neste blog, e com certeza terei a chance de lembrar e citar outras. Várias já se foram, mas deixaram fortes lembranças.

Era ano de eleições municipais e estaduais em São Paulo. Os políticos se movimentavam para arregimentar o maior numero possível de apoios para suas candidaturas, os mais procurados eram aqueles de prestígio em seus bairros, alguém com destaque na mídia, os ditos “formadores de opinião”, aqueles que pudessem contribuir financeiramente para suas campanhas promovendo reuniões churrascos, enfim aglutinando o maior número possível de pessoas, que pudessem render alguns votos.

Foi para uma dessas reuniões que certo dia fui convidado. O convite me sensibilizava pela comida, bebida e pelo dono da casa, que apesar de aposentado de suas atividades esportivas, era considerado depois de Pelé, o nosso maior ídolo.

Na casa de Adhemar Ferreira da Silva aconteceria o evento. Confesso que não me lembro do nome do candidato que ali se encontrava dando risadas cumprimentando a todos que chegavam inclusive a nós, um grupo de jovens totalmente desinteressados pelo mesmo.

Tinha mais gente ao redor de Adhemar do que do próprio candidato. Travamos um papo ao chegar, contei-lhe que havia chegado recentemente dos “states” e aos poucos fui me ambientando naquela casa bem charmosa no bairro da Casa Verde, vizinha a minha Santa Terezinha. Depois de me perguntar o que queríamos beber, serviu-me uma dose de “White Horse”, chopp a meus amigos e nos deixou totalmente a vontade. Era um verdadeiro gentleman o nosso anfitrião.

Enquanto no quintal rolava um churrasco, caminhei pela casa olhando os objetos de decoração, fotos, medalhas, troféus até que me deparei com um piano. Como até hoje faço, não me contive, abri a tampa do piano e comecei a dedilhar uns acordes. Aos poucos as pessoas na casa foram se chegando ao redor do atrevido pianista, que sem pedir licença tomou conta do instrumento.

Adhemar foi um atleta incrível. O único atleta brasileiro a ganhar 2 medalhas de ouro em Olimpíadas consecutivas. Na da Finlândia em 1952 ao saltar 16,22 metros e em Melbourne em 1956, quando cravou 16,35 metros, tornando-se bi campeão olímpico no salto triplo. Além dos feitos esportivos que foram muitos, Adhemar por sua competência, fineza, educação e cultura se destacou também na diplomacia. Foi adido cultural em Lagos na Nigéria durante 3 anos a convite do Itamarati e representou o Brasil em várias oportunidades.

Naquele dia, enquanto dedilhava aquele piano notei Adhemar se aproximando. Encostou-se e perguntou “Conhece Because of you?” ao que imediatamente comecei a tocar, pensando que queria me ouvir, mas, ele é que queria cantar aquela música. E não é que além de todos os predicados que já tinha, Adhemar era um excelente cantor? Depois veio “Ces ci bom”, cantada num excelente francês, encerrando sua audição, pois não queria ser o centro das atenções, afinal a festa não era dele.

Voltei reencontrar Adhemar em sua casa mais de 25 anos depois, quando o amigo em comum, na época Capitão Marciano, que trabalhava com ele na Secretaria de Bem Estar Social, me convidou para um churrasco lá na mesma Casa Verde. Adhemar era candidato a deputado. Foi um reencontro muito agradável. Lembro-me que chegamos já no final do churrasco e ficamos durante muito tempo conversando, ouvindo música e relembrando o dia que o acompanhei ao piano. Elza a esposa, a filha Adyel, uma afinadíssima cantora e Diego, o neto, por quem nutria um grande carinho, estavam presentes. Ele sempre gentil, fino e cativante. Era uma pessoa especial.

Depois disso encontrei com Adhemar mais algumas vezes, numa delas em um evento que fizemos em 1992 para crianças, patrocinado pela Coca Cola no estacionamento do Supermercado Pão de Açúcar no bairro de Moema e a ultima em 2000 no Estádio do Pacaembu quando acompanhava uma delegação de atletas universitários da UniSantana onde era coordenador de esportes.

A jornalista Tânia Mara Siviero com o apoio da Bolsa de Mercadorias & Futuros produziu um belíssimo trabalho muito bem documentado e ilustrado sobre Adhemar no ano de 2000 e que deu o titulo de “Herói por nós”.

Adhemar Ferreira da Silva faleceu em 12 de janeiro de 2001 aos 73 anos.

Na foto acima Adhemar prestigiando evento para crianças em Moema