quinta-feira, 30 de outubro de 2008

1965/Noites de Bossa

Sem dúvida alguma, o show" Opinião", foi  a grande manifestação músical dos anos 60. Idealizado por  Oduvaldo Viana Filho, Paulo Pontes e Armando Costa e dirigido por Augusto Boal, tinha no elenco Nara Leão , Zé Keti e João do Vale. 
Os autores juntaram  a garota de Ipanema, o malandro do morro e o nordestino para, numa narrativa musical muito forte, descrever as agruras do povo
 sofrido. E isso bem no momento, que se instalava a ditadura militar no Brasil. 
Durante o período que ficou em cartaz no Teatro Opinião no Rio de Janeiro, foi visto por mais de 25 mil expectadores . Seus ingressos eram mais disputados que uma final de Fla x Flu. 
No fim da temporada carioca, Nara Leão foi substituida por uma garota franzina,  com uma força incrível de interpretação, que transformou Carcará de João do Vale, em um verdadeiro hino. Era Maria Bethania, l8 anos. 
Em São Paulo, o Teatro Ruth Escobar ia ser inaugurado, e foi o escolhido por Boal para a temporada paulista de "Opinião". 
Bethania era a sensação,  apesar das marcantes participações de Zé Keti e João do Vale.   
No elenco aparecia também, com algum destaque, o violonista Jards Macalé. 
Enquanto na arena do Ruth Escobar "Opinião" fazia sucesso estrondoso, nós produzíamos no Teatro de Arena o "Noites de Bossa". 
A equipe de produção era composta por Moracy do Val, jornalista que tinha uma coluna de variedades no jornal Notícias Populares, Claudio Mamberti e Renato Correia de Castro, os dois, atores desempregados e que viviam lá, na espectativa de algum trabalho, e que, enquanto nada aparecia se uniram a nós, Haya e eu que dirigíamos os shows, e com muita competência, foram nossos coordenadores. 
Cuidavam da afinação do piano, de testar o som, menos a luz! disso, Haya e eu não abríamos mão, apesar do Orion, iluminador do teatro, reclamar o tempo todo, que a gente exagerava naquelas manobras que gostávamos de fazer. 
Boal nessa epoca, mal aparecia no Arena. Estava muito visado pela repressão, assim como o teatro. 
Certa vez, durante uma das últimas apresentações de" Lennie Bossa e Balanço" no Arena, Luiz Vergueiro foi gentilmente convidado a acompanhar um sujeito mal encarado, que o levou direto para uma Veraneio, deixando frustado o colega Solano Ribeiro, que se achou diminuido, por não ter sido incluido naquela detenção. 
O meio artístico estava sendo perseguido. O Teatro de Arena  tinha, por precaução, suspendido todas as peças programadas, e só música rolava por lá. 
Mas numa dessas raras visitas, Boal se aproximou de mim e do Haya para pedir um favor: "A Bethania trouxe do Rio um irmão dela,  estou bancando casa e comida também do irmão, será que vocês poderiam colocá-lo dentro das "Noites deBossa"? o rapaz canta direitinho, e tem umas músicas bem legais. 
Claro que atendemos o pedido do Boal, aliás, o primeiro pedido que ele nos tinha feito, já fazia quase um ano,  fora bem mais complicado que esse: passamos Haya e eu uma madrugada inteira rasgando e jogando dentro da privada do Arena, centenas de exemplares de "Revolução na America do Sul", editado na época pelo Massao Ohno. Não ficou vestígio. 
Mas esse pedido do Boal era tranquilo. 
Dias depois, apareceu o irmão de Maria Bethania. Franzino como a irmã, violão debaixo do braço, sandalias e roupas surradas. Um perfeito retirante. Ficamos meio espantados, mas fomos ouvir Caetano que,  com a voz fragil e se acompanhando  ao violão, cantou "É de manhã é de madrugada..." 
Pedimos se podia aumentar um pouco a potência de sua voz, pois já estava dando microfonia (som apitando). Aos poucos, fomos conseguindo um resultado melhor e Caetano chegou a se apresentar outras vezes . Claro, depois das aulas de Madalena de Paula, acabaram as microfonias.

Na foto, Caetano ao lado de Chico Buarque

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